sábado, 18 de junho de 2011

LEI MARIA DA PENHA



É impossível encontrar com o poeta Crispiniano Neto, ex-Secretário de Cultura do Rio Grande do Norte e não colher uma novidade. Principalmente no campo da poesia popular. Ontem, no aniversário da nossa amiga Lucinda Albuquerque, dona da Editora IMEPH, Crispiniano recitou-me esta pérola, de um cantador potiguar, cujo nome não consegui reter na memória. Ainda bem que não esqueci dos versos:


Mulher braba igual a minha
No mundo não há quem tenha
Ontem mesmo quis bater-me
Com uma tora de lenha
E eu me calei... com medo
Da Lei Maria da Penha!


É poeta ou não é, um peste desses?

Crispiniano está escrevendo um trabalho sobre a Lei Maria da Penha na Literatura de Cordel. Disse-me que já conseguiu reunir mais de 20 folhetos sobre o tema, a maioria aplaudindo os efeitos da dita lei, e alguns, lógico, distoando do côro dos contentes. O meu amigo Tião Simpatia lançou até um DVD enaltecendo essa Lei que pune a violência doméstica onde a mulher é sempre a vítima desprotegida. Cabra que bate em mulher tem que ser punido nos rigores da lei, ora se não!



Que isto não sirva de ofensa para as mulheres, mas voltemos ao coro dos descontentes: É o caso dessa obra da dupla Bentevi e Curió, que, imagino, deve ser uma dupla de emboladores de coco: Consequencias desastrosas da Lei Maria da Penha. O que ressalto aqui é o bom humor da poesia, longe de julgar se é ou não politicamente correta. Afinal de contas a dupla de poetas já começa afirmando em seu poema o velho bordão: "Em mulher não se bate nem com uma flor"... Nos dias de hoje, onde o politicamente correto é quem dá as cartas até poetar de maneira irreverente tornou-se uma atividade perigosa.
Mas, deixemos de lenga-lenga e vamos ver alguns trechos do referido poema:


O poeta sempre foi
Da mulher um defensor
Traça rimas, pensa trovas,
Canta sempre em seu louvor
E afirma com seu mister
Dizendo que na mulher
Não se bate nem com flor.


Poeta clássico ou matuto
MPB ou Romântico
Sempre elogia a mulher
Na poesia ou no cântico
Já dizia o Caetano:
- Com mulher eu não me engano
Isso é um produto quântico!


Porém o Roberto Carlos
Diz e ninguém acredita
Que a grande paixão do homem
Não tem medida nem fita,
Não se fala em quantidade,
O negócio é a qualidade,
Que tinha a Maria Rita.


Os nossos antepassados
Não casavam por amor
Os pais olhando os cifrões
Só pensavam no valor,
De algum doutor togado
De médico ou advogado
Deputado ou senador.


Vovó era astuciosa
Mas era mulher sensata
Pois temia a duas coisas
Ao marido e a barata.
A mulher sem temer nada
Se torna descontrolada
Doida, agressiva e ingrata.


O homem temente a Deus
Nunca pratica heresia
Mulher que teme ao marido
Nunca comete anarquia
Lava roupa, cria os filhos,
Se o homem sair dos trilhos
Não condena a bigamia.


Porém surgiu uma lei
Na qual a mulher se empenha
Fez cavalo de batalha
Pinta, borda e até desenha
Pois em nome do progresso
Foi votada no Congresso
A Lei Maria da Penha.


(...)

O certo é que antigamente
No tempos dos meus avós
A mulher não amarrava
E nem desatava nós...
Andava sempre na linha
Dormia com a galinha
Acordava com os socós.



Uma vaca disse ao touro
Tô cansada da ordenha
Você tem vinte e três vacas
Copula, cobre e emprenha,
Depois não dá um real
Porquê não tem no curral
A Lei Maria da Penha.


O touro então respondeu
Criatura, isso é um erro,
Já dizia um pecuarista
Lá na Fazenda Desterro:
- É isso que elas querem,
Triste do boi se fizerem
A Lei Maria Bezerro.


A galinha disse ao galo
Meu velho, eu estou cansada,
Pois toda mulher que erra
E fica mal-afamada
O povo chama: “galinha”
Meu Deus, que sorte mesquinha
Ando muito injuriada.


E o galo respondeu:
- Que asneira disseste tu
Já dizia um galo velho
Que morou no Iguatu
Meus jovens, se agüentem
Tomara que não inventem
Lei Maria Sobrecu!


A Lei Maria da Penha
Não trouxe uma solução
A mulher ficou afoita
Querendo mais confusão
E o cabra revoltado
Quando está embriagado
Finca o pé e mete a mão.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

ESCLARECIMENTO OPORTUNO

 
LITERATURA DE CORDEL
E POESIA MATUTA

Num comentário que fez na postagem de ontem, o poeta Marco Haurélio citou um trecho do livro Autores de Cordel, de Marlyse Meyer, que traduz a exata dimensão do poeta de bancada, sempre sedento de conhecimento:

"De modo geral, os poetas procuram se informar de tudo. Leem, quando podem, e tentam possuir uma pequena biblioteca. É o caso de Manoel Camilo, possuidor de uma estante cheia de livros. É também característica do poeta popular uma verdadeira obsessão pelo aprimoramento da linguagem. Justamente por isto, não podem ser confundidos com os chamados poetas matutos, os quais deformam de propósito o idioma, com o intuito de recriar a linguagem do homem do campo, que acreditam errada."

É isso, meus senhores e senhoras. O cordel, desde os primórdios, desde a longínqua estréia de Leandro Gomes de Barros e Silvino Pirauá de Lima vem primando pela correção da linguagem. É inadmissível, portanto, que pessoas esclarecidas (inclusive pesquisadores renomados) confundam a verdadeira Literatura de Cordel com a poesia matuta. Nada contra a segunda, uma singela expressão da cultura popular, onde pontificaram nomes como Catulo da Paixão Cearense, Zé da Luz, Patativa do Assaré, Luiz Campos e Alberto Porfírio. Costumo dizer que as duas são ramos do mesmo tronco, filhas da mesma árvore - o TROVADORISMO -, mas que cada uma tem suas peculiaridades. Ou seja, são galhos bem distintos.

A verdade tem que ser esclarecida, para que os leitores hodiernos não continuem comprando gato por lebre.

Vejam abaixo trechos de um excelente cordel produzido pelo poeta cearense Pedro Paulo Paulino, publicado hoje no seu blog:  www.vilacamposonline.blogspot.com


O MEU CORDEL ENCANTADO
Pedro Paulo Paulino


O meu cordel encantado
Está na televisão
Que eu trago sintonizada
No canal do coração,
Desde as primeiras leituras,
Com as imagens mais puras
Das coisas do meu sertão.

O meu cordel encantado,
Eu sempre tenho assistido
No dia a dia do povo
Deste Nordeste sofrido:
Um cordel risonho e franco,
Umas vezes, preto e branco,
Outras vezes, colorido.

O meu cordel encantado,
Repleto de poesia,
Está lá numa escolinha
Onde aprendi certo dia
O á-bê-cê e a tabuada,
Sem qualquer norma empregada
Na atual pedagogia.

O meu cordel encantado
Inda está sobre o balcão
Da bodeguinha modesta
Do meu pai, lá no sertão,
Onde à tarde, sem faltar,
Lia para ele escutar
Versos sobre Lampião.

O meu cordel encantado
Inda está na poesia
Cativante do romance
Coco Verde e Melancia,
No Malazartes Jocoso,
No Pavão Misterioso,
Que também pra ele eu lia.

O meu cordel encantado
Que conservo sempre eterno,
Pela mão que o escreveu,
Já nasceu velho e moderno,
Com metro e rima apurada,
Tem como exemplo, A Chegada
De Lampião no Inferno.

O meu cordel encantado
Tem bastante sensação,
Faz rir, como faz chorar,
Se lido com emoção.
O meu cordel tem sinônimo
Na história de Jerônimo
- O Grande Herói do Sertão.

O meu cordel encantado
Tem sentido e tem roteiro.
Grinalra e Sebastião,
Um romance verdadeiro.
Com saudade, sinto abalo
Ao lembrar certo cavalo
Que defecava dinheiro.

O meu cordel encantado
Eu lembro a todo momento.
Pela grandeza que tem,
Contagia o sentimento,
É feito com perfeição,
Como A Vida de Cancão.
E seu rico Testamento.

O meu cordel encantado
Que eu lia na infância minha
Era o mesmo que se lia
Numa casa de farinha,
Romance de drama e glória,
Tal como a bonita história
Do Pedrinho e a Julinha.

(...)


Ver postagem integral em:  http://www.vilacamposonline.blogspot.com/

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quinta-feira, 16 de junho de 2011

CORDEL NO CARNAVAL CARIOCA

DEPOIS DA TV, CORDEL GANHA A MARQUÊS DE SAPUCAÍ
 

Dizem que no Brasil, tudo acaba em samba... Acabava! Agora acaba tudo em cordel. 90% dos encartes de lojas que circularam em junho de 2011  aqui em Fortaleza usaram a gravura popular (de capas de folhetos) como principal ilustração. Até anuncios da TV seguiram a mesma trilha.

É sempre bom ver a cultura nordestina em destaque, sendo reconhecida em outros recantos do país. Depois que a Rede Globo lançou a novela Cordel Encantado é a vez de uma grande escola de samba do Rio de Janeiro (a Acadêmicos do Salgueiro) aproveitar o tema para o desfile de 2012. No entanto, essa badalação enorme que se criou em torno da Literatura de Cordel às vezes me anima e outras me preocupa. Para quem lê cordel desde a infância e conhece essa arte como a palma da mão, tais manifestações às vezes soam falsas e meio pasteurizadas. A intenção pode ser boa, mas o cordel com a sinopse do tema, que irá inspirar os compositores na elaboração do samba-enredo da Acadêmicos do Salgueiro  mistura, equivocadamente, o linguajar matuto (que não é utilizado pelo verdadeiro cordelista) com métrica claudicante e rimas duvidosas. É uma simbiose de Patativa do Assaré com o samba do crioulo doido. Passa é longe da arte de José Camelo de Melo, Leandro Gomes de Barros e José Pacheco da Rocha. Quantas vezes vou ter ainda que repertir que CORDEL é uma coisa e POESIA MATUTA é outra?

Sinceramente,  versos como "um cadim de inspiração" doem no ouvido. E TROVA rimando com EUROPA é de fazer o velho Manoel D'Almeida Filho se remexer na tumba! Outra coisa, ví xilogravuras de J. Borges, Costa Leite, Dila e outros artistas compondo o cenário (que por sinal está belíssimo)... Será que esses artistas populares nordestinos receberam alguma coisa de direito autoral? Afinal de contas, o carnaval carioca é um negócio altamente lucrativo, que movimenta cifras astronômicas. Não custa nada deixar uma moedinha cair na cuia do ceguinho cantador de feira, não é mesmo?


Os mais otimistas dizem que o cordel está ganhando projeção nacional, que será absorvido e digerido avidamente por todas as camadas sociais e por gente dos mais distantes rincões desse país continental. Os tradicionalistas vêm esse oba-oba com desconfiança, uma vez que o que vem sendo apresentado até aqui não passa de uma caricatura da poesia popular, com foco mais centrado na xilogravura. Fala-se muito que o cordel está em evidência graças à novela e outras manifestações afins, mas na prática, no frigir dos ovos, o que isto vem trazendo de positivo para o poeta popular? Que custo era contratar especialistas no assunto para uma consultoria?
Eu, particularmente, não quero cometer o pecado de julgar por antecipação o espetáculo que a Acadêmicos do Salgueiro prepara para o carnaval de 2012. Até porque, a ABLC (Academia Brasileira de Literatura de Cordel), instituição da qual faço parte, será homenageada pela referida Escola de Samba... De repente, pode vir coisa boa por aí, mas pelo sim, pelo não, estou com as barbas de molho.

Vejam, a seguir, matéria extraida do blog "Quintal do Lobisomem", mantido pelo poeta Victor Alvim, capoeirista famoso no Rio de Janeiro, autor de diversos folhetos:

"A tradicional escola de samba Acadêmicos do Salgueiro acertou em cheio ao escolher o tema do seu próximo carnaval. A vermelha e branca tijucana vai levar para a avenida o enredo "Cordel Branco e Encarnado", de autoria de Renato Lage e Márcia Lage.

A escola pretende unir a arte dos poetas populares do Nordeste com o inconfundível batuque carioca. Sem esquecer das origens do cordel na Europa , que ressurgiu com toda a força no Nordeste em histórias que caíram no gosto popular, como "O Romance do Pavão Misterioso", obra que inspirou os carnavalescos a criarem a logomarca do enredo salgueirense.

A sinopse do enredo foi apresentada aos compositores no dia 14 de junho em reunião na quadra da Rua Silva Teles e surpreendeu a todos por ter sido escrita em forma de poema como um tradicional cordel. Tive a oportunidade de estar presente trocando informações com o carnavalesco Renato Lage, a diretoria cultural e parte da sua talentosa equipe, entre eles Gustavo Mello, Eduardo Pinto, Dudu Azevedo e Luciane Malaquias.

Como poeta popular, cordelista e membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel gostaria de parabenizar a Acadêmicos do Salgueiro por escolher um enredo que verdadeiramente aborde uma das maiores riquezas da nossa cultura popular brasileira.
E uma bela parceria está se iniciando entre estas duas academias: a do samba e a da literatura de cordel.
Confiram abaixo a sinopse na íntegra:

Salgueiro 2012
(Cheio de poesia, imaginação e encantamento)

Minha "fia", meu senhor
Deixa eu me apresentar
Sou poeta e meu valor
Vai na avenida passar
Basta imaginação
Um "cadim" de inspiração
Que eu começo a versar

Vou cantar a minha arte
Que nasceu bem lá distante
Num lugar que hoje é parte
Da nossa origem errante
Vim das bandas da Europa
Nas feiras, a boa trova
Era demais importante!

Foi assim que o mar cruzei
Na barca da encantaria
Chegou por aqui um Rei
Com bravura e poesia
Carlos Magno e o os doze pares
Desfilando pelos mares
Da mais real fidalguia

E veio toda a nobreza
Que um dia eu imaginei
Rainha, duque, princesa
E até quem eu não chamei:
Um medonho de um dragão
Irreal assombração
Dessa corte que eu sonhei

Também tem causo famoso
Que nasceu lá no Oriente
De um tal misterioso
Pavão alado imponente
Que cruza o céu de relance
Dois jovens, e um só romance
Vencendo o Conde inclemente

Todas essas histórias
Renasceram no sertão
Onde vive na memória
O eterno Lampião
E não houve um brasileiro
Que de Antônio Conselheiro
Não tivesse informação

Pra viajar no meu verso
É preciso ter "corage"
Vai que um bicho perverso
Surge que nem "visage"?
Nas matas sertão afora
Lobisomem, caipora
Que medo dessas "image"!!

Pra findar esse rebuliço
Rezar é a solução!
Valei-me meu "padim" Ciço!
Vá de retro, tentação!
Nossa Senhora eu não quero
(Tô sendo muito sincero)
Cair nas garras do cão!

E não é que meu santo é forte?
Cheguei ao céu divinal
É tamanha a minha sorte
A minha vitória afinal
É cantar com alegria
Fazer verso todo dia
Na terra do carnaval

Ao ver chegar a tal hora
Da minha "alegre" partida
Saudade, palavra agora
Tem posição garantida
Mas não se avexe meu irmão
Que hoje a coroação
Acontece é na avenida

Pois eles hão de herdar
Todo esse sertão sonhado
Monarcas que vão reinar
Na corte do Sol dourado
Poetas de tradição
Recebam de coração
Um cordel Branco e Encarnado

E agora eu vou sem medo
Fazer festa "de repente"
Vai nascer um samba-enredo
Pra animar toda a gente
Afinal, não sou melhor
Muito menos sou pior
Só um poeta diferente!


Renato Lage, Márcia Lage, Departamento Cultural
Fotos: Vicente Almeida e Gustavo Mello
Saiba mais notícias sobre a literatura de cordel no carnaval do Salgueirono site: www.carnavalesco.com.br

MESTRES DO CORDEL - V

JOSÉ PACHECO DA ROCHA


Costumo dizer sempre que as maiores influências que recebi como poeta cordelista vêm da infância, dos versos que ouvia meu pai recitar a caminho do roçado e dos folhetos de Leandro Gomes de Barros e José Pacheco que minha avó lia à luz de lampião após o jantar. A intriga do cachorro com o gato, do mestre José Pacheco, era um dos meus favoritos. Sátira deliciosa, com tom de fábula.  Este poema foi declamado em 2002 nos salões da Academia Cearense de Letras pelo saudoso pesquisador Ribamar Lopes para uma platéia embevecida. É que Ribamar sabia dar as tintas certas à narrativa, entremeando-a com seus ótimos comentários. Por exemplo: Ribamar achava muita graça do machismo do bichano, que, mesmo de porre, bota moral na mulher:



Quando o cachorro falava
Gato falava também
Gato tinha uma bodega
Como hoje os homens têm
Onde vendia cachaça
Recostado ao armazém.

Rei Leão mandou Cachorro
Efetuar uma prisão
E o cachorro passando
Na venda do gato então
Pediu pra beber fiado
O gato disse: - Pois não!


Subiu-se na prateleira
Uma garrafa desceu
Um cruzado de aguardente
O cachorro ali bebeu
Botou fumo no cachimbo
Pediu fogo e acendeu.


(...)

Embebedaram-se ambos
Garrafas secaram três
Cachorro fez um discurso
Falando bastante inglês
Gato embolava no chão
Discursando em francês...

A gata mulher do gato
Saiu de lá, veio cá,
E disse um tanto agastada
Vocês dois procedem "má"
O gato disse: - Mulher,
Da porta do meio pra lá!

(...)

Detalhe: essa raríssima fotografia do poeta José Pacheco foi extraída da capa de um folheto que trata de sua peleja com João Martins de Athayde.


BIOGRAFIA DE JOSÉ PACHECO
Por Leonardo Vieira de Almeida

José Pacheco da Rocha, ou José Pacheco, como é mais conhecido, nasceu no Município de Corrientes, em Pernambuco, residindo algum tempo na cidade de Caruaru, naquele mesmo estado.

Viveu muitos anos em Maceió, Alagoas, vindo a falecer naquela cidade, provavelmente em 1954. Folhetos de sua autoria foram publicados pela Luzeiro Editora, de São Paulo. Recentemente, a Editora Queima-Bucha, de Mossoró (RN), publicou o folheto A intriga do cachorro com o gato. Além disso, há edições de suas obras pela Catavento, de Aracaju (SE); Lira Nordestina, de Juazeiro do Norte (CE); Coqueiro, de Recife (PE), e por outras editoras.

Seus folhetos mais importantes são História da princesa Rosamunda ou a morte do gigante e A chegada de Lampião no inferno. As histórias de gracejos são um dos aspectos marcantes dos cordéis de José Pacheco, considerado um dos maiores cordelistas satíricos do Brasil. Mas o poeta se dedicou também a outros temas, como histórias de bichos, religião e romances.

Referências

▪ GOVERNO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Secretaria do Estado de Ciência e Cultura e Departamento de Cultura – INEPAC/Divisão de Folclore. O cordel no Grande Rio. Rio de Janeiro: 1978.

▪ LOPES, Ribamar. Literatura de cordel: antologia. Fortaleza (CE): 1983, BNB.

▪ PROENÇA, Manoel Cavalcanti (Org.). Literatura popular em verso: antologia. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 1986.

▪ CARDOSO, Tânia Maria de Souza Cardoso. Cordel, cangaço e contestação: uma análise dos cordéis "A chegada de Lampião no inferno" (José Pacheco da Rocha) e "A chegada de Lampião no céu" (Rodolfo Coelho Cavalcante). Rio Grande do Norte: Coleção Mossoroense, 2003.


Fonte - site da CASA DE RUI BARBOSA


* * *



EM TEMPO: O folheto A intriga do cachorro com o gato está incluído na caxinha do Projeto Acorda Cordel na Sala de Aula. Esta caixa vem acompanhada de um livro e um CD. Custo total do KIT = R$ 60,00. Maiores informações:  acordacordel@ig.com.br

quarta-feira, 15 de junho de 2011

O ECLIPSE EM CORDEL

JOÃO GRILO E O ECLIPSE LUNAR

 João Grilo - Desenho: JÔ OLIVEIRA

Neste 15 de junho, todos os brasileiros terão o privilégio de observar um belíssimo fenômeno celeste: o eclipse total da Lua. Neste dia, logo após o pôr-do-Sol, a Lua nascerá em sua fase cheia (condição fundamental para a ocorrência de um eclipse do gênero), e já nascerá sendo "engolida" pela sombra projetada do nosso planeta. Se as condições climáticas de sua cidade permitirem um céu sem nuvens, vale muito a pena dar um tempo de suas atividades e se dar ao prazer de ficar uma hora olhando para a Lua. Se você tem crianças em casa, leve-as para ver o fenômeno. É algo que marca, que fica como boa lembrança e instiga à curiosidade pelo estudo de Ciências.

E para a Astrologia, o que significa um eclipse lunar?

Para os antigos, não era um bom sinal, mas por motivos que eram mais supersticiosos do que dignos de nota. Atualmente, há uma tendência de boa parte dos astrólogos em reavaliar o significado dos eclipses, compreendendo-os como um momento especial de hipersensibilização de determinadas áreas do mapa astrológico de cada pessoa. Esta hipersensibilização não é necessariamente negativa, mas se o indivíduo não tiver muita consciência do processo, pode passar por dias complicados.
O próximo eclipse lunar do dia 15 de junho ocorrerá no eixo Gêmeos-Sagitário, próximo a 25 graus, afetando portanto de modo mais poderoso as pessoas que nasceram no terceiro decanato destes signos.


O eclipse lunar na Literatura de Cordel

Para o poeta popular e astrólogo João Ferreira de Lima, que editou por muito tempo o Almanaque de Pernambuco, um dos mais conceituados do gênero, o eclipse lunar era sinal de mau agouro. Pelo menos é o que se deduz dos versos que escreveu no célebre folheto AS PROEZAS DE JOÃO GRILO:

João Grilo foi um cristão
Que nasceu antes do dia
Criou-se sem formosura
Mas tinha sabedoria
E morreu depois das horas
Pelas artes que fazia

Na noite que João nasceu
Houve um eclipse na lua
E detonou um vulcão
Que ainda hoje continua
Naquela noite correu
Um lobisomem na rua...

Por influência de seu nascimento, no momento do eclipse, João Grilo cresceu irreverente e endiabrado. Vejamos o que aprontou com o vigário do povoado onde nasceu:

...
Um dia a mãe de João Grilo
foi buscar água à tardinha
deixando João Grilo em casa
e quando deu fé, lá vinha
um padre pedindo água
nessa ocasião não tinha

João disse; só tem garapa;
disse o padre; donde é?
João Grilo lhe respondeu;
é do engenho catolé;
disse o padre: pois eu quero;
João levou uma coité.

O padre bebeu e disse:
oh! que garapa boa!
João Grilo disse: quer mais?
o padre disse: e a patroa
não brigará com você?
João disse: tem uma canoa.

João trouxe uma coité
naquele mesmo momento
disse ao padre: beba mais
não precisa acanhamento
na garapa tinha um rato
tava podre e fedorento.

O padre disse: menino
tenha mais educação
e por que não me disseste?
oh! natureza do cão!
pegou a dita coité
arrebentou-a no chão.

João Grilo disse: danou-se!
misericórdia, São Bento!
com isto mamãe se dana
me pague mil e quinhentos
essa coité, seu vigário,
é de mamãe mijar dentro!

O padre deu uma popa
disse para o sacristão:
esse menino é o diabo
em figura de cristão!
meteu o dedo na goela
quase vomita um pulmão.

...

terça-feira, 14 de junho de 2011

MONTE JÁ A SUA CORDELTECA



Adquira folhetos e livros de vários autores e monte a sua CORDELTECA. A literatura de cordel está sendo cada vez mais procurada por educadores, estudantes e leitores em geral. Para montar sua biblioteca de cordel, consulte quem entende do assunto. Dispomos de um grande estoque e podemos fornecer os maiores clássicos do gênero, além de livros que tratam do assunto.

Veja alguns títulos do nosso estoque:

- Romance do Pavão Misterioso
- As proezas de João Grilo
- O Soldado Jogador
- Chegada de Lampião no Inferno
- O Batizado do Gato
- A gramática em cordel

- A noiva do gato
- A vida de Pedro Cem
- Iracema, a virgem dos lábios de mel
- A donzela Teodora
- A didática do cordel
- João Bocó e o ganso de ouro
- O rico ganancioso e pobre abestalhado
- O justiceiro do Norte
- O castigo da inveja ou o filho do pescador
- Jerônimo e Paulino ou o prêmio da bravura
- A sorte do preguiçoso e o peixinho encantado
- Quirino, o vaqueiro que não mentia
- Peleja de Zé Ramalho com Zé Limeira, o poeta do Absurdo
- Peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum
- Juvenal e o Dragão
- Pedrinho e Julinha
- Viagem a Baixa da Égua


LIVROS:

- Pavão Misterioso em quadrinhos
- Batalha de Oliveiros com Ferrabras em Quadrinhos

- 2ª Edição do livro ACORDA CORDEL NA SALA DE AULA

- 12 Contos de Câmara Cascudo em CORDEL - Caixa temática

- Antologia de cordéis do poeta Bule-Bule

- Vertentes e evolução da Literatura de Cordel



E MUITOS OUTROS




PARA ADQUIRIR A SUA CORDELTECA, ENTRE EM CONTATO
CONOSCO ATRAVÉS DO E-MAIL:

acordacordel@ig.com.br


MANDAMOS PELO CORREIO, PARA QUALQUER PARTE DO BRASIL!!!

Dos arquivos da revista O CRUZEIRO

O SENHOR FEUDAL DO FECHADO

Gustavo Barroso

Gravura de Jô Oliveira
                                                                                             
                Escreveu Pascal que é por demais perigoso mostrar a animalidade do homem sem apontar a sua grandeza, sendo pior deixá-lo na ignorância de ambos e convindo, portanto, fazer-lhe ver esses dois aspectos de sua personalidade. Devem estas sábias palavras do insigne pensando francês servir sempre de base àqueles que estudam o fenômeno do cangaceirismo nos sertões nordestinos em todas as suas modalidades, porque os chamados bandidos ou bandoleiros por ele produzidos oferecem-nos exemplares humanos de complexa psicologia, algumas vezes dignos até do título de heróis.
                Em livro que a respeito publiquei há perto de 40 anos, disse: “Os bandidos não são produtos exclusivos das letras brasileiras do Nordeste. Em todos os povos, tem existido com denominações diversas. O jagunço não é criminoso por mero acidente do seu caráter; não é criminoso, as mais das vezes, por si próprio. Ele termina uma série de antecedentes os mais variados ou é um elo na seriação de causas as mais diversas.”
                Dentro dessas linhas gerais deve ser enquadrada historicamente a figura de um dos mais famosos cangaceiros do sertão cearense na segunda metade do Século XIX, José Antônio do Fechado, nascido em Canindé no ano da graça de 1824, sob o governo do nosso primeiro imperador. Quando veio ao mundo, já se espraiava a milagrosa nomeada do padroeiro daquela terra — S. Francisco das Chagas. No fim do Século XIII, as autoridades coloniais tinham aldeado naquele rincão, ao fundo do antigo Sertão dos Ratos, que se estendia pelas ribeiras do Rio Ceará até aquelas paragens, os índios da nação Canindé, até esse tempo acampados na povoação de Monte-Mor-o-Novo da América, depois vila e enfim cidade de Baturité. E já em 1775 o português Francisco Xavier de Medeiros edificava ali a primeira capela dedicada ao Pobrezinho de Assis. A construção, em grande parte feita de esmolas, levou 20 anos. Ao ser  terminada em 1795, o glorioso santo obrou o primeiro milagre, salvando da morte certa um operário que caíra do andaime da torre. A notícia correu célere por todo o interior cearense, iniciando-se, então, as peregrinações que fariam do Canindé a Compostela ou Lourdes do Ceará. Passaram-se 22 anos e o bispo de Pernambuco, D. Frei Antônio de S. José, elevou, em concessão especial de 10 de junho de 1817, a capela à Matriz, tal a importância que adquirira. Um alvará de  D. João VI, de 30 de outubro do mesmo ano, aprovou a citada concessão. Todavia o povoado do Canindé somente seria elevado à categoria de vila, com todas as suas prerrogativas municipais, por ato do governo imperial de 29 de julho de 1846. Tinha nessa data, José Antônio do Fechado a idade de 22 anos.
                Seu pai, o capitão José Bernardo de Sousa Uchoa, antigo presidente do Senado a Câmara, proprietário da fazenda do Fechado, era um dos homens mais influentes da localidade. Representante legítimo por sua posição, educação e tendência do antigo patriarcalismo feudal que informou a vida pastoril nordestina e degenerou, mais tarde, no coronelismo, lutava pelo domínio da política municipal e, naturalmente, se tinha muitos amigos, também fizera inimigos. Entre estes, o maior era o tenente-coronel Manuel Mendes da Cruz Guimarães. No sertão, o ódio dos pais passa para os filhos e as famílias se empenham em lutas renhidas, que se propagam através das gerações como na Itália medieval.
                No ano de 1852, quando o Império Brasileiro atingia seu apogeu, militarmente com a vitória dos Caseros, politicamente com a conciliação dos partidos realizada pelo futuro marquês do Paraná, diplomaticamente com a orientação do futuro visconde do Uruguai e financeiramente com o ágio do papel-moeda sobre o ouro, na vila do Canindé se processará com violência a eleição do novo juiz de paz, que devia substituir o que completara o quadriênio. O triunfo na mesma demonstraria quem de fato tinha eleitorado e prestígio no município. Exercendo o cargo de delegado de Polícia, o capitão José Bernardo de Sousa Uchoa disputava-o contra seu rival, o tenente-coronel Cruz Guimarães, e seu braço direito era o filho Antônio, em plena virilidade sertaneja.
                Tinha o moço renome de valente. Os inimigos paternos lhe haviam atribuído a morte dum tal Marcolino, que raptara uma moça e com ela casa contra a vontade da família. Achava-se José Antônio na companhia de um amigo, Carlos Sales, parente da jovem, quando este se encontrou com o rapaz e lhe tirou a vida. As opiniões sobre o caso dividiram-se. Os mais apaixonados acusavam veementemente a José Antônio. Os seus amigos e parentes eximiam-no de toda a culpa. Alguns havia que admitiam ter ele ajudado o companheiro a consumar o crime. Submetido a processo e levado ao Tribunal do Júri, este o absolveu. As más línguas, porém, nunca o perdoaram.
                No dia da eleição, houve grande e grave conflito entre os partidários dos Uchoas e dos Cruz Guimarães. A briga começou a cacete e faca na Igreja, onde se realizava o pleito, acabando em tiroteio pelas ruas, durante o qual morreu baleado o tenente-coronel Manuel Mendes da Cruz Guimarães. Apontou-o José Antônio como autor do feito. Foi outra vez processado e submetido a julgamento. De novo, os juízes de fato o absolveram. Murmurava-se que desta, como da primeira vez, por influência da família e do seu partido político.
                No decurso do tempo, por este ou por aquele motivo, quatro assassínios se atribuíram a José Antônio. Mais duas vezes processado e julgado, foi absolvido. Diziam os amigos que era homem valente, cavalheiresco e generoso, capaz de praticar as mais belas ações. Assuavam-lhe os inimigos que não passava duma fera e moviam-lhe contínua, implacável perseguição. Refugiado em sua fazenda do Fechado, cercado de acostados fiéis, verdadeiros bravi,  ele acabou não se deixando mais citar pela Justiça e resistindo à prisão, de armas em punho. Certa vez, um destacamento de mais de cem praças cercou-lhe a casa e foi repelido com muitas perdas, depois de violento assalto.
                O barão feudal sertanejo continuou entocado. Nos últimos anos da Monarquia, conta-se que o comandante da Polícia do Ceará, moço destemido, decidiu acabar com o José Antônio. Levou consigo numerosa tropa, acampou-se nas proximidades do Fechado e, antes de desencadear o ataque, vestido à paisana, montou a cavalo e explorou os arredores. Queria conhecer bem o terreno onde pisava. Numa volta da estrada, encontrou um homem já encanecido, porém forte, sadio, musculoso, de fisionomia simpática, voz suave e lhana, maneiroso e afável, bem montado, com o qual se pôs a conversar. Aproveitando a ensancha, o oficial procurou obter informações sobre o cangaceiro, pois que o cavaleiro era, segundo parecia, morador das cercanias.
                O desconhecido contou-lhe que a casa do Fechado constituía verdadeira fortaleza, com paredes e portas à prova das balas daqueles tempos, que lá havia capangas que cada estaca das cercas era um homem armado. Todos eles bravos e fiéis. Depois, narrou minuciosamente o que sabia da vida do José Antônio, das injustas acusações de que era vítima, dos atos de justiça que praticava e das razões de honra pessoal que o levaram a não se submeter às autoridades. Assim conversando lado a lado, chegaram a uma encruzilhada, onde se despediram. O comandante declinou sorridente, seu nome e qualidade, fazendo oferecimentos corteses. O outro sorriu, tirou o chapéu, apertou-lhe a mão e disse-lhe com a maior calma deste mundo:
                — Minha casa fica ali adiante, por trás daquele morro. Estou lá às suas ordens. É a fazenda do Fechado e eu sou o José Antônio.
                Picou o cavalo com as esporas e sumiu-se na caatinga. O oficial ficou estarrecido no meio da estrada. Contam que voltou ao acampamento e regressou a Fortaleza, recusando-se a perseguir o caudilho sertanejo. Esta é uma das narrativas, decerto lendárias, que contribuíram para aureolar de prestígio aos olhos do povo a figura desse senhor feudal do Século XIX.
                Em avançada idade, atingiu o limiar do Século XX, de vez que faleceu em 1918, com 94 anos de idade, na fazenda Lagoa das Pedras, onde nos últimos tempos de sua vida passara a residir. Durante alguns anos foi obrigado a morar em Fortaleza, capital do Estado, a fim de evitar a perseguição política que lhe moviam na terra natal. E o curioso é que se casou aos 86 anos. Fibra extraordinária a desses velhos sertanejos criados em contato com a natureza agreste e rude, formadora duma raça de fortes. Deles diria Júlio César o que disse dos belgas, que eram os mais viris dos povos da Gália, porque viviam longe das cidades, isto é dos centros de civilização e amolecimento, de todas as coisas que ad affeminando animos pertinent.

* * *

NOTA DO BLOG - Esse texto foi reproduzido a pedido do poeta SILVIO ROBERTO SANTOS. O fluente relato do grande historiador Gustavo Barroso é uma excelente referência para o poeta popular. Eis um texto que precisa ser resgatado em cordel. Alguém se habilita?

segunda-feira, 13 de junho de 2011

SÃO FRANTÔNIO


O CASO DO SANTO SEM CABEÇA

Arievaldo Viana

João Batista Azevedo dos Santos, conhecido popularmente como Jota Batista, é um dos novos poetas canindeenses de reconhecido talento e de inspirada verve humorística. São de sua autoria dois folhetos bastante curiosos relatando dois fatos distintos relacionados com São Francisco de Canindé. O primeiro refere-se à construção de uma estátua gigantesca de São Francisco, em Canindé e o outro, intitulado A Verdadeira História da Viagem de São Francisco ao Piauí, mexe com o fanatismo religiosos de muitos canindeenses que acreditam que a cidade irá se acabar, caso a estátua milagrosa de São Francisco seja retirada do altar-mor da Basílica.

O primeiro folheto refere-se a um monumento projetado em Canindé, do qual foi concluído apenas a cabeça, ao passo que na vizinha cidade de Caridade-CE, tentava-se construir uma estátua de Santo Antonio, da qual apenas o corpo ficou erguido no topo de um serrote.

Deixemos falar o poeta Celso Góes Almeida, que assim se manifestou na apresentação do folheto O Santo do Ano 2001 – São Frantônio, deste inspirado cordelista: “Jota Batista tem revelado, através de seus trabalhos poéticos um infinito senso de humor e irreverência (...) Neste cordel , deixa a marca indelével de seu humor apurado, na composição de versos de dez linhas, onde narra as dificuldades encontradas pelos nossos escultores para a conclusão das estátuas de Santo Antonio e São Francisco (Canindé)”.

Assim começa o irreverente folheto:

“Na vizinha Caridade
Planejaram um monumento
Que ia ser o sustento
Do turismo da cidade
E havendo necessidade
De realizar o sonho
Neste verso aqui exponho:
Depois de tanto bulir
Resolveram construir
A estátua de Santo Antonio.

Que o leitor me acredite
No que agora vou falar
Espero que não se irrite
Também não quero aumentar
A água sumiu na baixa
Sumiu dinheiro no caixa
Sumiu de tudo, seu moço,
Depois da pouca colheita
A estátua só foi feita
Do pé até o pescoço”.

O monumento, projetado em Caridade, (que ficou apenas no corpo) teria dimensões gigantescas, devendo equiparar-se ao Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, e à estátua do Padre Cícero, em Juazeiro do Norte. Canindé, centro de uma das maiores romarias do País, não poderia ficar atrás, por isso resolveu partir para construção de um monumento de proporções similares:

“Seguindo este traçado
E movido pela fé
Houve outro plano bolado
Em nosso bom Canindé.
A idéia é do prefeito
Que assim que foi eleito
Se mostrou bastante arisco
Mal ele saiu do ovo
Já foi prometendo ao povo
A estátua de São Francisco”.

O problema é que a parca verba liberada só deu para concluir a cabeça da citada escultura, vindo daí a justa reclamação do poeta:


“Só não quero que ele esqueça
De fazer o tronco e membro
Se ele esquecer eu me lembro
Nem que ele se aborreça...
Se a estátua ficar de pé
Vem gente pra Canindé
Do campo e da Capital,
Se o restante não for feito
Eu tenho dentro do peito
Uma idéia genial”.
A idéia “genial” engendrada por Jota Batista é colocar a estátua no limite entre os dois municípios. Caridade entraria com o corpo inacabado de Santo Antonio e Canindé com a cabeça de São Francisco. Vejam só o nome escolhido para o novo “padroeiro”.

“Tenho outra idéia melhor
A pagode não me tome
Pra coisa ficar menor
A gente junta os dois nomes
Sacoleja na cumbuca
Balança o corpo e a cuca
Eu to com um medo medonho,
A seca ta nos matando
E o povo está apelando:
- Valei-nos, ó São Frantônio!


O poeta, sem perder o senso de humor, prevê logo uma briga entre as duas cidades, desejosas de saber para que lado ficaria a frente do monumento. Mais uma vez, Jota Batista comparece com outra de suas idéias:
“E para diminuir
O sofrimento do povo
Eu já tenho um plano novo
Esse é bom se discutir
Usando a imaginação
A gente agrada ao povão
E termina com a história,
Acredito que o Bibi
Não se nega a construir
Uma estátua giratória”.
Depois de desculpar-se com os escultores Bibi e Franzé de Aurora, autores das duas obras, Jota Batista resolve penitenciar-se também a Deus e aos dois santos vítimas da brincadeira:

“Minha mente eu não alugo
Peço aqui perdão a Deus
Aos dois santos não expurgo
Isso é apenas versos meus
Não levem a sério o artista
Inda mais Jota Batista
Por causa deste rabisco
De toda fé que disponho
Dou vivas a Santo Antônio
E palmas pra São Francisco”.


Embora não tenha sido muito rigoroso no esquema das rimas, há de se convir que o relato de Jota Batista está calcado no mais fino humorismo, lembrando em certos momentos a verve prodigiosa de José Pacheco e Leandro Gomes de Barros. O caso virou matéria na imprensa brasileira.

* Matéria publicada na Revista Singular, de Eliézer Rodrigues - Edição de março/2002.

Jota Batista, caricatura de Arievaldo Viana


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EM TEMPO! O prefeito de Caridade-CE, Júnior Tavares, apresentou ao Governador Cid Gomes um projeto para construção do Complexo Turístico e Religioso Santo Antônio, que inclui a construção da tão sonhada estátua de Santo Antônio no topo do serrote "Cágado", que fica ao leste da cidade. Veja abaixo a justificativa do projeto:


CARIDADE NA ROTA DO TURISMO CEARENSE

Situada a apenas 90km de Fortaleza, servida pela BR-020 e pelas rodovias estaduais que interligam os Sertões de Canindé à General Sampaio e Maciço do Baturité (a projetada Estrada da Pendanga), Caridade está na rota do turismo cearense por sua posição geográfica privilegiada. Ao leste, o município extrema com a Região do Maciço de Baturité e breve terá o acesso facilitado com a estrada que interligará Campos Belos à Guaramiranga. Ao sul, Caridade faz divisa com Canindé, o maior santuário Francisco das Américas. Além do mais, Caridade sedia três estações do complexo “Caminhos de Assis”, construído pelo Governadro Cid Gomes. À Noroeste, o município faz fronteira com o Vale do Curu e tem vias de acesso que vão desaguar em Jijoca de Jericoacoara.
A construção do Complexo Religioso de Santo Antônio, com a instalação de uma estátua do padroeiro de Caridade no Serrote que está situado ao nascente da cidade, juntamente com uma infra-estrutura de apoio logístico ao turismo, colocará Caridade definitivamente na rota do turismo cearense como uma atração que interligará o Turismo Religioso de Canindé com o Turismo da Região do Maciço. Além disso, Caridade possui um Museu que já está cadastrado nacionalmente e eventos pitorescos de repercussão regional como a Missa dos Vaqueiros, os festejos de seu padroeiro Santo Antônio e o tradicional Arraiá do Povo, que é realizado anualmente no dia 12 de junho, mas que também se repete em outras datas nas festas religiosas dos distritos.
O fortalecimento do turismo em Caridade, além de gerar ocupação e renda, servirá também para o escoamento do artesanato que é produzido na região. Por esse motivo, acreditamos que o Governador Cid Gomes dará total apoio à este projeto que impulsionará o turismo e a economia do município de Caridade e  Região.